Noah Loren<p><span><b>Pensar a História<br>Nobel da Paz para um assassino em massa: os crimes de Henry Kissinger<br>Secretário de Estado dos EUA foi um dos principais formuladores da política externa norte-americana e deixou legado de crimes de guerra no mundo<br>Estevam Silva<br>São Paulo<br>16 de outubro de 2024,<br>às 13:49</b></span></p><blockquote>Há 51 anos, em 16 de outubro de 1973, o Comitê Norueguês do Nobel tomava uma das decisões mais bizarras da história da premiação: conceder o Prêmio Nobel da Paz a Henry Kissinger, o então secretário de Estado da Casa Branca.<p>Kissinger foi um dos principais formuladores da política externa norte-americana desde o governo de Richard Nixon e deixou um legado de destruição, atrocidades e crimes de guerra em todo o planeta.</p><p>Nascido em Fürth, na Alemanha, Kissinger emigrou com sua família para os Estados Unidos em 1938, fugindo da perseguição nazista aos judeus. Convocado a servir no Exército norte-americano em 1943, foi designado para atuar em uma unidade de inteligência militar, em razão de sua fluência na língua alemã.</p><p>Após o término da Segunda Guerra Mundial, concluiu seus estudos em Harvard, onde se formou em ciência política.</p><p>Início da carreira na política externa<br>Na década de 1950, Kissinger atuou como membro do Conselho de Relações Exteriores e foi nomeado diretor do Projeto de Estudos Especiais do Rockefeller Brothers Fund. Nos anos 60, trabalhou como conselheiro de política externa de Nelson Rockefeller, então candidato às primárias do Partido Republicano, e prestou serviços como assessor à Casa Branca.</p><p>Em 1969, após a vitória eleitoral de Richard Nixon, Kissinger, já renomado como um especialista em política externa, assumiu o cargo de Conselheiro de Segurança Nacional. Posteriormente, foi nomeado secretário de Estado, permanecendo nessa função até o governo de Gerald Ford.</p><p>Durante esse período, Kissinger exerceu papel central na formulação da diplomacia e das doutrinas militares norte-americanas, defendendo a primazia da “realpolitik” como meio de viabilizar os interesses estratégicos de Washington.</p><p>Em busca de dividendos políticos durante a Guerra do Vietnã, Kissinger sabotou as negociações de cessar-fogo que estavam sendo conduzidas pela gestão de Lyndon Johnson, o que resultou no prolongamento da guerra por mais cinco anos. Ele também revogou a política de arrefecimento dos bombardeios imposta em 1968, pressionando pelo uso extremo da força militar, com emprego indiscriminado de bombardeios contra vilarejos e alvos civis e a ocorrência de dezenas de massacres perpetrados pelos soldados norte-americanos.</p><p>Kissinger expandiu o conflito para além das fronteiras do Vietnã, intensificando os ataques ao Laos e submetendo o Camboja a uma violenta campanha de bombardeios de saturação que devastaram o país. As ofensivas mergulharam o Sudeste Asiático em uma verdadeira carnificina e deixaram milhões de civis mortos.</p><p>Paradoxalmente, foi o papel de Kissinger na Guerra do Vietnã que serviu de justificativa para que ele fosse laureado com o Prêmio Nobel da Paz. Ele foi indicado em conjunto com o dirigente comunista vietnamita Le Duc Tho, com quem travou as negociações de cessar-fogo durante os Acordos de Paz de Paris.</p><p>Le Duc Tho, no entanto, rejeitou o prêmio. A entrega do Nobel a Kissinger permanece até hoje como a mais controversa da história da premiação. A decisão foi alvo de escárnio por parte da imprensa e levou dois membros de comitê de seleção a renunciarem em protesto.</p><p>Ainda no início dos anos 70, Kissinger avalizou outra matança em larga escala no continente asiático. Temendo a criação de um Estado não alinhado na antiga província do Paquistão Oriental e visando estabelecer um contrapeso regional à China e Índia, Kissinger apoiou o ditador paquistanês Yahya Khan durante a Guerra de Independência de Bangladesh, incentivando o massacre perpetrado contra os nacionalistas bengalis e a minoria hindu.</p><p>Estima-se que até três milhões de pessoas morreram durante o genocídio em Bangladesh e que cerca de 400.000 mulheres foram vítimas de uma campanha de estupros em massa. Não obstante, Kissinger manteve apoio incondicional ao regime paquistanês, tratando com desdém as denúncias das atrocidades. Também evidenciou em diversas ocasiões seu pensamento racista, ao chamar os indianos de “bastardos” e desqualificar a premiê Indira Gandhi como “uma vadia”.</p><p>Henry Kissinger reunido com o ditador chileno Augusto Pinochet em 1976<br>Kissinger e a América Latina<br>Kissinger foi um dos principais arquitetos da política de respaldo aos regimes ditatoriais da América Latina durante a Guerra Fria. Em 1962, esteve no Brasil como adido do governo norte-americano e auxiliou nos preparativos para o golpe militar que resultaria na queda de João Goulart dois anos depois.</p><p>No Chile, ele orquestrou a campanha golpista contra o governo do socialista Salvador Allende, financiando a imprensa e os movimentos de oposição, cooptando os setores sediciosos das Forças Armadas e prestando auxílio aos grupos terroristas e organizações neofascistas locais.</p><p>Kissinger também incumbiu a CIA de organizar um plano de desestabilização econômica contra o governo chileno, por meio de locautes, boicotes e sabotagens, com o objetivo de “fazer a economia gritar” e atrair o apoio dos setores médios. Em 1973, um golpe militar comandado por Augusto Pinochet e apoiado pelos militares norte-americanos resultou na morte de Allende e converteu o Chile em uma das ditaduras mais sangrentas da América Latina.</p><p>Legitimado e endossado por Kissinger, o regime de Pinochet se prolongou por 17 anos e deixou um saldo de milhares de mortos e desaparecidos.</p><p>O respaldo de Kissinger às ditaduras militares latino-americanas prosseguiu ao longo dos anos 70 através da Operação Condor — uma campanha coordenada de repressão política e terror de Estado, levada a cabo pelas ditaduras militares do Cone Sul e apoiada pelo governo norte-americano, responsável pelo assassinato em massa de opositores e inúmeras violações de direitos humanos.</p><p>Kissinger foi diretamente implicado no assassinato de opositores de Pinochet, tais como Rene Schneider e Orlando Letelier. Ele também apoiou o golpe militar de 1976 na Argentina e respaldou a chamada “Guerra Suja” movida pelo ditador Jorge Rafael Videla, que resultou na criação de mais de 400 campos de concentração secretos e no assassinato e desaparecimento de cerca de 30 mil opositores, rotulados como “terroristas” pelo regime argentino. Durante uma visita à Argentina em 1978, Kissinger elogiou efusivamente Videla pelo que chamou de “combate ao terrorismo”.</p><p>As ações norte-americanas pelo mundo sob comando de Kissinger<br>Kissinger também coordenou as ações do governo norte-americano durante a Guerra Árabe-Israelense de 1973, fornecendo apoio militar e financeiro para garantir a vitória de Israel no conflito. Nos anos seguintes, o secretário de Estado costurou o Acordo Provisório do Sinai e atuou para desarticular a união entre as nações árabes, logrando o isolamento da resistência palestina e legitimando o expansionismo de Israel sobre os territórios ocupados.</p><p>A ação de Kissinger pavimentou o caminho para os infames Acordos de Camp David, encerrando a possibilidade de obter uma solução justa e permanente para a questão Israelo-Palestina.</p><p>Em 1974, Kissinger encorajou o conflito entre a Grécia e a Turquia pelo controle político do Chipre. Após dar seu aval ao golpe organizado pela ditadura grega que derrubou o governo cipriota de Makarios III, a Casa Branca apoiou a subsequente invasão de Chipre pelas Forças Armadas da Turquia, deixando a nação insular à beira de uma guerra civil.</p><p>No ano seguinte, temendo a instalação de um governo de esquerda em Timor Leste, Kissinger incentivou a invasão do país pelas tropas da Indonésia e aconselhou o ditador Suharto a reprimir brutalmente o movimento independentista. A operação contou com forte apoio militar dos Estados Unidos e resultou no assassinato de mais de 200 mil pessoas — cerca de um quarto da população timorense.</p><p>Na África do Sul, Kissinger demonstrou enfaticamente seu apoio ao regime do apartheid. O secretário de Estado chegou a se reunir com o premiê sul-africano John Vorster para negociar o financiamento norte-americano para o setor de mineração na Rodésia apenas uma semana após o Massacre de Soweto — quando os policiais sul-africanos assassinaram mais de 500 crianças e adolescentes que protestavam contra o regime segregacionista.</p><p>Ele também se aliou ao governo sul-africano para apoiar os movimentos anticomunistas que se opunham às organizações independentistas de esquerda, tais como a UNITA, opositora do MPLA. Apoiou igualmente a colonização do Saara Ocidental pelo Marrocos e ajudou os militares portugueses na guerra travada contra os movimentos anticoloniais africanos.</p><p>Kissinger deixou o cargo de secretário de Estado após a vitória de Jimmy Carter na eleição de 1976, mas seguiu atuando ativamente na definição da política externa do país. Ele integrou a Comissão Trilateral, fundou sua própria empresa de consultoria e participou dos conselhos administrativos de diversas multinacionais.</p><p>Em 2002, foi nomeado por George W. Bush como presidente da comissão criada para investigar os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, atribuídos à Al-Qaeda. Apoiou a invasão norte-americana ao Iraque e a estratégia geopolítica da “Guerra ao Terror”, que permitiu a expansão do domínio geopolítico dos Estados Unidos sobre as reservas de gás e petróleo do Oriente Médio, ao custo de mais de quatro milhões de vidas.</p><p>Kissinger morreu de causas naturais em 2023, aos 100 anos de idade, acumulando, além do Prêmio Nobel, a Medalha Presidencial da Liberdade e outras centenas de títulos honoríficos, comendas e láureas, e sem jamais ter sido responsabilizado por nenhum de seus crimes.</p><p>Por ocasião de sua morte, foi saudado pela grande imprensa como “um dos maiores diplomatas do século 20” — comprovando mais uma vez que o vaticínio de que “a história vai cobrar” não passa de uma frase de efeito.</p></blockquote><p><a href="https://operamundi.uol.com.br/pensar-a-historia/nobel-da-paz-para-um-assassino-em-massa-os-crimes-de-henry-kissinger/" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">operamundi.uol.com.br/pensar-a…</a></p><p><a href="https://libranet.de/search?tag=Nobel" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>Nobel</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=NobelDaPaz" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>NobelDaPaz</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=HenryKissinger" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>HenryKissinger</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=Kissinger" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>Kissinger</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=News" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>News</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=Noticia" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>Noticia</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=WarCrimes" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>WarCrimes</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=HumansRights" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>HumansRights</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=GeorgeWBush" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>GeorgeWBush</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=EUA" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>EUA</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=USA" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>USA</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=Crimes" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>Crimes</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=Pol" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>Pol</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=Economy" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>Economy</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=OrienteMedio" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>OrienteMedio</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=America" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>America</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=AmericaDoNorte" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>AmericaDoNorte</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=NorteGlobal" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>NorteGlobal</span></a> <a href="https://libranet.de/search?tag=SulGlobal" class="mention hashtag" rel="nofollow noopener noreferrer" target="_blank">#<span>SulGlobal</span></a></p>